domingo, 26 de julho de 2020

Medicina alternativa das parteiras e rezadeiras: uma revisão de bibliografia


Ana Elisa Biesek Leite

INTRODUÇÃO

Em cada pedaço de chão do interior do nosso Brasil existem homens e mulheres que são curadores, que aplicam a sabedoria ancestral, em chás de ervas, banhos e benzimentos, com rezas e cantos, e com essas práticas conseguem minorar muitos dos males que atingem os que o consultam. Assim, são essas pessoas, que têm suprido a falta de atendimento médico em localidades remotas. As rezadeiras são líderes naturais nas comunidades onde vivem. São respeitadas, principalmente pelas mães que, na maioria das vezes, optam por suas rezas para curar os filhos das doenças. Comum recorrer à flora sertaneja  para fazer lambedores, purgantes, emplastros, pomadas e garrafadas, acompanhadas de gestos e orações, rezas, benditos, novenas, ofícios, terços, rosários, entre outros recursos de cunho religioso. Entre as diversas funções que essas pessoas desempenham, está o parto, o qual ocorre em casa, desde muito tempo, até hoje, principalmente por pessoas com uma condição social mais baixa e que vivem em locais mais afastados, como no interior dos estados. Dr. José Galba Araújo fala sobre a importância das parteiras e rezadeiras nesses interiores, justificada pela precária assistência a saúde. Ele realizou um trabalho no interior do Ceará, com a ajuda da Maternidade Escola Assis Chateubriand, que tinha o objetivo de auxiliar no conhecimento dessas mulheres, para elas saberem diferenciar quando o parto ou o recém nascido precisava de cuidados hospitalares e, quando podiam realizar os procedimentos e rituais sem interferência externa. Do mesmo modo em que auxiliaram as parteiras, também houve um trabalho com as rezadeiras para saberem o que deveria ser feito com aquelas crianças que estavam tendo algum problema de saúde, já que essas eram as que primeiro iam ser procuradas pelos pais. Foi aí que introduziram a ideia de reidratação oral, também incluída no trabalho da Dra. Zilda Arns em 1983, ajudando a salvar diversas crianças da desidratação, que era uma das maiores causas de morte infantil na época.

OBJETIVO GERAL

  • Analisar os diferentes métodos da medicina alternativa, realizada pelas parteira e rezadeiras no interior dos estados.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

  • Relatar a importância das parteiras e rezadeiras para a medicina alternativa. 
  • Apresentar os benefícios de capacitar essas mulheres. 
  • Elucidar os médicos que contribuíram para o treinamento das parteiras e rezadeiras. Expor o que é comum na homeopatia na assistência ao parto.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica sobre a história da medicina alternativa na assistência a saúde, principalmente no parto, visando elucidar a evolução que houve nesse tema de acordo com referenciais teóricos.
Conforme Leopardi (2002), a pesquisa bibliográfica é utilizada quando o tema requer a análise de publicações para reconhecer sua regularidade, frequência, tipos, assuntos examinados e métodos empregados, em textos.
Este tipo de pesquisa envolve nove etapas, são elas: escolha do tema, levantamento bibliográfico preliminar, formulação do problema, elaboração do plano provisório de assunto, busca das fontes, leitura do material, fichamento, organização lógica do assunto e redação do texto (GIL, 2009).
Para a sua elaboração, foi necessário consultar trabalhos publicados em livros, em revistas eletrônicas, portais do Ministério da Saúde e em artigos científicos.
O levantamento bibliográfico foi realizado no período do 1º semestre de 2020, compreendendo os artigos publicados nos últimos quarenta anos a partir de consulta bibliográfica computadorizada, realizada via google acadêmico.
A busca na base de dados foi realizada com a utilização dos seguintes descritores: Homeopatia, Alopatia, Medicina Alternativa, Assistência ao Parto, Parteiras, Rezadeiras.
Para a seleção dos artigos, foram considerados como critérios de inclusão os seguintes: artigos completos disponíveis eletronicamente e que apresentem aspectos relevantes, considerando o tema em estudo. Serão excluídas as teses, os resumos e os anais publicados em congressos, além de artigos publicados em língua estrangeira.
Após a seleção dos artigos, foi realizada uma leitura superficial do material obtido, para selecionar o que era de interesse para a pesquisa. Em seguida, realizou-se uma pesquisa mais detalhada, a fim de não serem perdidos aspectos importantes para o enriquecimento do estudo e da redação final da pesquisa.

RESULTADOS

Estima-se que existam mais de 60 mil parteiras tradicionais em atuação no Brasil. Muitas delas, vivem nos recantos profundos do país, em comunidades vulneráveis social e economicamente, onde são as únicas referências de saúde. Por meio da arte do partejar, elas dedicam suas vidas, fazeres e saberes ao povo brasileiro. No entanto, estão no ostracismo das políticas públicas e muitas vivem em situação precária, sem nenhum amparo governamental.
O Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa) destaca que o trabalho das parteiras pode evitar cerca de dois terços de todas as mortes maternas e entre recém-nascidos registradas no mundo. De acordo com a entidade, as parteiras também são capazes de oferecer 87% de todos os serviços relacionados à saúde sexual, reprodutiva, materna e do recém-nascido.  No Brasil, anualmente, são realizados, em média, 41 mil partos domiciliares, desses a maioria é assistida por parteiras tradicionais. Mesmo sendo dados subnotificados ao Sistema de Informação à Saúde do Ministério da Saúde (DATASUS), os números nos mostram que as parteiras tradicionais existem e que seus trabalhos deveriam estar dentre as preocupações de gestores e profissionais de saúde de todas as regiões, principalmente Norte, Centro Oeste e Nordeste. Além disso, o parto domiciliar assistido por parteira tradicional é um direito reprodutivo reconhecido por autoridades nacionais e internacionais de saúde. Para as parteiras, o respeito ao tempo do processo fisiológico constitui o grande diferencial entre o modo de cuidar delas e dos médicos.
A opção do indivíduo recorrer à parteira, a rezadeira e ao curandeiro para solução de seus problemas de saúde perpassa, em muitos casos, pela precariedade da assistência médica, principalmente devido à ausência de médicos, o que contribuiu para que essas múltiplas experiências dessem significados aos métodos alternativos de cura.
Nessa atmosfera da crença, é notável a devoção das rezadeiras aos diversos Santos, um apego muito grande ao mundo religioso que venera em sua própria casa, para além daquelas práticas de curas. Outras dimensões da cultura também eram resignificadas, a partir da inter-relação dos costumes de manter uma vida intercedida por Santos protetores, que tendem a assegurar a estabilidade cotidiana das rezadeiras em função de alguma promessa ou devoção por alguma graça alcançada. Nesse caso os Santos equivalem à personificação das forças sagradas entre os seres humanos, em função de suas concepções religiosas. Nesse contexto, Dr. Galba Araújo iniciou um projeto chamado de Atenção Primária em zona rural do Ceará, no qual observou que as pessoas mais influentes nesses locais eram as parteiras tradicionais, as quais faziam parte do processo de nascimento da maior parte das crianças do nordeste e em muitas partes do mundo.
Assim, o trabalho baseou-se em capacitar essas mulheres a diferenciar um parto de risco ou não, para encaminhar imediatamente a um centro médico, caso necessário; e ensinar também os procedimentos iniciais em uma situação de emergência e desse modo, diminuir a taxa de mortalidade. Do mesmo modo que capacitaram as parteiras, foi necessário mostrar a importância da  reidratação oral, para não deixar que as crianças chegassem a desidratação. Foi introduzido um componente de sais minerais utilizado pela UNICEF, porém logo depois foi adaptado para utilizar o que tinha no local, como água de arroz, caldo de milho, água de Côco, chás, entre outros, chamados de farmácia vida, os quais foram associados aos rituais, para ter o mínimo de interferência nos costumes locais.
Os rituais das rezadeiras são próximos do que os padres entendiam como doutrina espírita. Por isso, as benzedeiras, por muito tempo foram isoladas do convívio com a Igreja Católica, devido a interpretação de fenômenos de mediunidade. Com o passar do tempo, foram adquirindo espaço na sociedade e hoje estão presentes em grande parte das comunidades, como uma alternativa de apoio. “Enquanto a medicina e a alopatia curam as doenças do corpo, as rezas curam as doenças da alma”, é o dito popular.
Outro trabalho semelhante foi do da Dra. Zilda Arns que realizou seu projeto baseado em cinco ações básicas da saúde, sendo estas, saúde da gestante, aleitamento materno, vacinação, controle de peso e soro caseiro. Sendo este último semelhante ao que a UNICEF utilizava. Entendendo que as parteiras e rezadeiras eram pessoas muito influentes e diretamente ligadas a população que deveria ser ajudada, Dra. Zilda ensinou a essas mulheres a fazer o soro caseiro e incluir nos seus rituais, com o objetivo de diminuir os casos de desidratações e consequentemente a taxa de mortalidade.

CONCLUSÃO

A medicina tradicional é um sistema de cura utilizado por povos ou comunidades para o tratamento de seus diversos males. A sua prática é baseada no conhecimento tradicional associado ao uso da biodiversidade, transmitido de geração em geração e; no uso de diversos recursos como: remédios caseiros, dietas alimentares, banhos, benzimentos, orações, aconselhamentos, aplicação de argila, entre outros. O saber e o cuidar das parteiras e benzedeiras, quando comparado ao da ciência, mostra maior competência para criar, tecer e enredar as intersubjetividades que permeiam as ações necessárias na rede do cuidado em saúde. Considerando isso, podemos concluir a importância da medicina alternativa usada pelas parteiras e rezadeiras, e a influencia destas na comunidades dos interiores, tendo o seu trabalho voltado para ajudar na saúde da população de suas cidades. Utilizam tudo que foi repassado pelos seus antecedentes, mesmo com pouco ou nenhum embasamento cientifico, no olhar de um profissional de saúde, porém com uma eficácia comprovada.
  
BIBLIOGRAFIA

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BURKE, Peter. O que é historia cultural? Tradução: Sérgio Góes de Paula. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
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